Quase não sou mais eu | E-book | Ivan Berger
Escrever é evocar o que não se consegue viver. É projetar na escrita um mundo interior que nem sempre, ou quase nunca, encontra correspondência na realidade. Posto que o que se vê, o que se vive, não passa de interpretações pessoais de coisas invariavelmente distorcidas, meras versões fantasiosas do que, cedo ou tarde, se revela completamente diferente do que parecia. Quem ama, ou pensa que ama, está sempre propenso a exageros, juízos e conclusões equivocadas, aos arroubos típicos da paixão. Que como se sabe, ofusca, obnubila o bom senso, a razão. Daí não raro soarem patéticos, inconvenientes, e até mesmo chatos os versos com que se pretende enaltecer a mulher amada, a musa inspiradora. Pior ainda quando no afã de reconquistá-la, fazê-la voltar, evocando o antigo amor para ela, morto e enterrado. Diante do que, longe de compartilhar do mesmo sentimento, sequer entender o teor dos versos, faz a gente parecer ainda mais tolo do que o normal.